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Cap. Portos da Bahia| Leonardo Reis: "Todo acidente traz lições. E a gente sempre pode melhorar"

Atualizado: 23 de ago. de 2018

Dados, dúvidas, questões, acidentes, novos projetos... O Mar Bahia foi recebido pelo Capitão de Mar e Guerra, Leonardo Andrade da Silva Reis, carioca de 48 anos, que esclareceu em uma longa entrevista o atual panorama da navegação nos mais de 1100km de costa na Bahia e Sergipe.


MAR BAHIA – Nos últimos anos vem crescendo o número de incidentes e acidentes com embarcações na BTS. A que a CPBA atribui este aumento?

CAP. PORTOS DA BAHIA – Na verdade, nos últimos anos a gente percebe que houve uma redução de acidentes, cerca de 12% a menos, entre 2015 e 2017. O que acontece é que, infelizmente houve um grande acidente que fugiu em muito em relação ao tipo de acidentes das estatísticas dentro da Baia de Todos os Santos. Seguimos no caminho desta redução de acidentes, até porque há uma maior consciência entre usuários e condutores – que são os principais agentes deste cenário. Nos compete, como braço fiscalizador, estar presente e coibir as irregularidades. Isso fazemos o tempo inteiro, dentro das nossas possibilidades, em um trabalho que é feito 24h por dia, de domingo a domingo. E os números refletem este trabalho que incessante que é feito.

De acordo com dados oficiais da CPBA, houve uma redução de 12% no número de acidentes registrados entre 2016 e 2017

MB - São constantes as reclamações da população, especialmente dos usuários mais frequentes, o transporte precário que é feito, sobretudo em Ilha de Maré. Como a CPBA atua nesta fiscalização?


CPBA – O nosso foco é a segurança da navegação. Não posso afirmar para você que elas são embarcações confortáveis, mas que são sim, pequenas e funcionam em condições que não são de competência da Marinha, sobretudo no que tange aos terminais. Estamos cobrando com mais veemência o uso de coletes nas travessias, por entender que os passageiros estariam mais seguros. Mas, de forma alguma, podemos dizer que não são embarcações seguras. São sem conforto, mas atendem aos padrões exigidos pela Capitania dos Portos.


MB – Qual é a abrangência de ação da Capitania dos Portos da Bahia?


CPBA – Bem, nós temos 1100km de costa. Ao norte, nossa extremidade de jurisdição é Mangue Seco e vamos até o sul de Porto Seguro. A Capitania em Salvador atua diretamente no Litoral Norte até Camamu. Temos ainda duas delegacias subordinadas à CPBA, que é uma em Ilhéus e outra em Porto Seguro.


Atualmente, 27.730 embarcações estão cadastradas na CPBA (veleiros/lanchas e jets), com 26.918 amadores inscritos

MB - Sendo a maior baia do Brasil, a BTS tem peculiaridades específicas em relação a outras capitais do país. É possível enumerar algumas? Existe um planejamento da CPBA de forma a abraçar esta vastidão?


CPBA – É muito grande realmente, a maior do Brasil. Mas, em 95% do tempo a BTS é muito protegida, calma, porém, claro, com picos onde com determinadas condições apresenta fragilidades, sobretudo com ventos sul, sudeste e nordeste. Mas são condições raras aqui. Ou seja, as principais peculiaridades que põem risco à navegação são mar grosso, muito grosso e ressacas – e vale ressaltar que essas condições não têm ligações com as chuvas, como muita gente pensa, mas com os ventos. Essas condições são monitoradas constantemente pelo Centro de Hidrografia da Marinha, que emite avisos de mau tempo. Esses avisos destacam quais são estas condições adversas e são distribuídos aos clubes, iates, marinas, pescadores, colônias, imprensa...para que todos estejam atentos e que tenham zelo e precaução, caso se lancem ao mar. Em 2017, tivemos um ano realmente atípico e complicado aqui na Bahia, justamente por causa da incidência de muitos avisos de mau tempo, mas, acredito que condições assim demorem bastante para voltarem a acontecer.


MB - Dentro da BTS, quais são as localidades campeãs em infrações e quais são elas?


Na BTS, o ponto mais flagrante é a Ribeira, sobretudo no que tange às motos aquáticas. Fizemos, inclusive, uma operação chamada "Choque de Ordem", onde intensificamos as fiscalizações, como também em Barra do Jacuípe e em algumas travessias como para Ilha de Maré, sobretudo no que tange ao embarque e desembarque. Quanto às infrações são as mais variadas possíveis... Absurdamente há de todos os tipos, mas a que menos toleramos são as que envolvem a segurança dos banhistas. Isto é inadmissível. Seria muito interessante se houvesse um plano de gerenciamento costeiro para podermos trabalhar com mais regras de delimitação de espaço entre banhistas e embarcações. Isso precisa ser legalizado, mas infelizmente este plano ainda não ficou pronto e não compete somente à Marinha, mas também às prefeituras, que fazem as legislações. Salvador ainda está mais distante dessa criação, mas algumas cidades no sul da Bahia já trabalham neste sentido de forma mais efetiva.


Ranking de infrações cometidas no período de janeiro de 2017 a março de 2018:

1 - Não portar documentos de registro de embarcação ou certificados equivalentes exigidos;
2 - Certificados ou documentos equivalentes exigidos com prazo de validade vencido;
3 - Apresentar-se sem a dotação regulamentar - extintores, bomba de esgoto, pirotécnicos, lanterna e outros; e
4 - Apresentar-se com a dotação incompleta - coletes e boias salva-vida, extintores, pirotécnicos.

MB – Vem chegando o inverno e um período de maior intensidade de chuvas e ventos fortes na BTS. De que forma a CPBA se prepara para agir dentro deste contexto?


CPBA – Na Operação Verão intensificamos a fiscalização em todos os aspectos e agora no Outono/Inverno nós estamos com um projeto, onde vamos tentar criar mecanismos de alerta mais eficientes dos que já existem. Esse projeto ainda depende de recursos, mas estou te falando em primeira mão, pois terá um foco na Bahia. A intenção é que consigamos mapear de forma mais eficiente determinados pontos a fim de prestar o devido apoio na navegação. Vamos receber pessoas altamente qualificadas que vão nos ajudar a ter estes alertas mais efetivos de pontos mais expostos, pois como a BTS é muito grande, enquanto em um ponto as condições são tranquilas, em outro isso pode não acontecer. Então, vamos fazer um maior gerenciamento de risco, mas deixando claro de que a responsabilidade de enfrentar ou não estas condições adversas são do condutor.


MB – É inevitável falar sobre a nossa maior tragédia até então, o acidente com a lancha Cavalo Marinho I. Onde se encontra a lancha e qual é o andamento do inquérito atualmente?

CPBA – Encerramos a nossa parte em termos de Capitania, concluindo o inquérito e encaminhando o relatório ao Tribunal Marítimo, com todos os laudos periciais. Foi um trabalho extremamente intenso e bem apurado - para você ter uma ideia foram 1350 páginas em nosso inquérito – onde tivemos apoio de profissionais de grande gabarito e extremamente qualificadas, para analisar tudo de forma muito profissional e minuciosa. Tudo isso para fazer um trabalho digno das nossas e das expectativas da sociedade. E não foi fácil. A embarcação se destroçou na praia da Penha e tivemos que reconstruir a lancha, reprojetando e analisando todos seus aspectos na presença de nossos engenheiros navais. Concluímos a causas, os responsáveis e agora cabe ao Tribunal Marítimo julgar o caso. A média de tempo para estes julgamentos é de dois a três anos. Os destroços da embarcação foram retirados pela empresa, a quem compete esta remoção.


MB - O que mudou após este acidente?


CPBA – Todo acidente traz lições. E a gente sempre pode melhorar em algum aspecto. O nosso trabalho foi e é feito, mas a onipresença em todos os lugares é impossível. Se fizermos uma analogia com o transporte rodoviário, apesar das intensas fiscalizações, é o comportamento do usuário que vai definir a natureza da maioria dos casos. Até então, as mudanças não foram muitas porque já vínhamos fazendo um bom trabalho, mas desde o acidente, passamos a exigir nas embarcações de transporte um equipamento chamado “AIS”, que monitora via satélite as embarcações em tempo real. O ferryboat, por exemplo, já usa este equipamento e a tendência é que isso vá se ampliando para outras embarcações.


O segundo procedimento que alteramos foi uma mudança nos mecanismos de fechamento laterais das lanchas, que chamamos de “sanefas”. A partir de agora, exigimos que elas sejam acionadas a partir de dispositivos de destravamento rápidos. Uma outra mudança foi a maior exigência de coletes nas travessias – não somente em Mar Grande, mas em Ilha de Maré, Morro de São Paulo e demais travessias. Mas, há uma resistência muito grande por parte da população em usá-los. Em relação específica ao acidente, as causas apontadas foram negligência e imprudência, então seguimos realizando o nosso trabalho da melhor forma possível, mas não há como haver um preposto específico para fiscalizar o cumprimento das exigências 24h/dia. Vale ressaltar que nada impede que a Agerba também faça sua parte e atue fiscalizando, assim como nada impede que o próprio cidadão faça as suas denúncias e exija o cumprimento dos seus direitos. É uma força conjunta. Nossos canais para isso, sim, funcionam ininterruptamente.


MB – Ao mesmo tempo em que há um maior número de acidentes, é visível também o esforço da CPBA em se aproximar cada vez mais da população e da comunidade náutica. Fale um pouco sobre isso.


CPBA – Sim, isso é feito principalmente através de nossas campanhas e projetos ao longo do ano, como a Legal no Mar, com a participação da comunidade náutica e de artistas a fim de mobilizar de forma mais abrangente a população, além das palestras, sobretudo ao navegante amador, que são realizadas nas marinas e na própria CPBA. O turismo náutico na Bahia, como ainda é muito embrionário, nosso foco de orientações e esclarecimentos ainda é o transporte de passageiros, por isso focamos em campanhas e programas neste sentido, além da capacitação profissional e da realização de regatas – tudo a fim de nos aproximarmos da comunidade marítima.


"Sou fã da Bahia, por isso, suspeito pra falar. Todo lugar tem seus aspectos positivos, mas devemos ressaltar os positivos, por isso, confesso que em breve, pretendo morar aqui na Bahia"

MB – Para o senhor, o que faz das águas do mar da Bahia um lugar especial se para navegar?


CPBA – São muito tranquilas. Quando vejo na Contorno um espelho na água, dá vontade de sair do carro e ir para o mar! Além do enorme espaço que existe para se navegar, dando uma aptidão única ao estado. E sobretudo a temperatura da água, que é muito agradável e convidativa para que as pessoas desfrutem do mar.


MB - O Sr. navega?


CPBA - Sim, em quase todas as modalidades! Sempre que posso aproveito esse mar maravilhoso.


Fique por dentro


Fotos: Mar Bahia



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