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Foto do escritorMar Bahia

Gente do Mar: David Perrone

Instrutor Náutico

Foto: Mar Bahia

Uma das figuras mais emblemáticas da náutica na Bahia, David Perrone, mais conhecido como David Xará, conversou com o Mar Bahia por quase uma hora. Em meio a casos, histórias, risadas e muito conhecimento, o dono desse estilo único dividiu um pouco da sua vasta experiência a bordo, comprovando por quê é, sem dúvida alguma, Gente do Mar.


"Apesar da minha vida inteira ter sido praticamente vivida no mar, estudei de forma convencional na Escola Técnica (Pontes e Estradas) e depois Economia na Ucsal, mas vi que aquilo não era minha praia e não concluí. Tenho 68 anos e desde 14 que sou apaixonado por esse universo. Aprendi a navegar de forma autodidata, "na tora", quando a fibra de vidro ainda era um mistério (risos). Em uma determinada época, há cerca de 30 anos atrás, foi fundado um grupo de estudos náuticos no antigo Centro Náutico da Bahia, onde eu fui convidado a participar como conselheiro e iniciou-se este trabalho com uma grande equipe com foco no desenvolvimento da náutica na Bahia", declara David ao ser questionado como tudo começou.


Desenvolvimento Náutico

A questão do desenvolvimento náutico, aliás, é sempre posta em pauta quando é discutido o que foi e o que vem sendo feito neste segmento. "Pra você ter ideia, nessa época nós recebíamos mais de 30 regatas internacionais, além de programas de inserção social e formação de mão-de-obra, que até hoje gera empregados no ferryboat, na Bahia Marina e diversos locais no estado. Foi um longo e intenso trabalho que propagou a Bahia internacionalmente, mas que hoje se findou. Não havia foco político, havia foco em trabalho. Hoje o que há é uma involução muito grande neste sentido, um desalento. O Prodetur está tentando dar impulso à náutica no estado, mas ainda não há uma consistência nisso. Faço votos de que este projeto consiga dar continuidade ao que foi feito, pois ainda há muito a ser construído. Náutica emprega, gera impostos e melhora a condição de vida de seus usuários. É uma ideia tacanha associar náutica com riqueza e status. Veja como cresceu o stand up, as canoas havaianas, equipamentos mais baratos que muitos "brinquedinhos" de terra. Não importa como você vai para o mar, há categorias para todo mundo. O importante é estar na água. É um desperdício passar sua vida inteira sem conhecer esse universo. É decidir e rumar", desabafa David.


O destino da Bahia é ser náutico, não tem pra onde correr. Clima maravilhoso, temperatura da água, intensidade do vento...em qualquer lugar do mundo, a Bahia seria o point da náutica, mas aqui não.

Com a desativação do Centro Náutico, no bairro do Comércio, ele seguiu sendo uma referência em cursos de instrução náutica, passando a dar aulas no Yacht Clube da Bahia, onde segue atuando, formando mais de cinco mil alunos ao longo deste tempo.

A bordo, dando aulas práticas de navegação. Foto: Arquivo Pessoal

"Eu leio muito e as pessoas não tem paciência de aprender lendo. Eu gosto de estudar e se pudesse era pago só pra fazer isso (risos). Você vence dificuldade com persistência. Não tem outro caminho. Sempre conto nos meus cursos a história de quando decidi ser capitão. Eu abria os livros e aquilo era incompreensível...navegação astronômica era um mistério dificílimo! Então, decidi usar 15 dias das minhas férias e dedicar 8 horas por dia para estudar e entender aquilo. Eu estava decidido a fazer o curso e passar. Não deu outra e eu tinha certeza de que havia dominado o assunto. Ao chegar no Aratu Iate Clube, encontrei com amigos que também iam fazer a prova super desanimados com o assunto. Eu disse que se eles quisessem eu já poderia far um curso para eles, a fim de ajudá-los. Aí um deles me perguntou: Você já é capitão a quanto tempo?" E eu disse: "Vou fazer a prova com vocês!" E aí foi aquela agonia, mas no fim das contas eles fizeram o curso e todos nós passamos de primeira. Detalhe: o suboficial que aplicava as provas na Capitania não nos deu a menor confiança, pois segundo ele - durante 13 anos de trabalho, ninguém havia sido aprovado. É brincadeira?! (Risos). Daí em diante os cursos se tornaram periódicos e hoje sigo dando aulas de Arrais, Mestre e Capitão, além de serviços de batimetria e rotas de GPS", explica.


Lanchas x Veleiros

Com o aumento de pessoas interessadas em estar no mar e aprender a navegar, cresce também as responsabilidades, algumas rixas e a necessidade de uma maior infraestrutura para embarcações. "Veja que as marinas de estão lotadas de lanchas e jet ski, quase sem vagas. Faltam rampas de acesso ao mar, faltam vagas até para guarderias de pranchas e canoas. Quem quiser investir em marinas em Salvador tem um caminho próspero pela frente. Vocação não nos falta, só é preciso trabalhar.


Hoje eu digo a você que está acontecendo uma profunda mudança no comportamento dessas pessoas que foram apelidadas de "lancheiros". Essa distinção de velejadores e donos de lanchas já não faz mais tanto sentido porque os chamados "lancheiros" querem aprender cada vez mais e propagam suas atividades com muita responsabilidade. Exceções sempre vão existir, mas boa parte dessa comunidade já está bastante ciente dos seus direitos e deveres no mar. A navegação a motor é mais rápida, mas te dá menos autonomia. O conhecimento da Vela é mais complexo, mas te dá um conforto de ir para onde você quiser apenas com o vento. Basta se programar e estudar as condições de cada destino. Para tudo é preciso estudo e precaução. O importante não é a embarcação, mas o comportamento de quem a está conduzindo".


Repare, se uma pessoa compra um barquinho e quer usufruir desse potencial maravilhoso, ela leva velejando cinco anos sem repetir um lugar!
A bordo com amigos de longa data no mar. Foto: arquivo Pessoal

De acordo com David, o mar é um lugar que só traz felicidade, mas para navegar é imprescindível se preparar. "Você não pode jamais culpar a natureza porque o vento fica forte, a maré vaza, faz ondas (Risos), quem tem que se preparar é você para usufruir essa riqueza da natureza e não ela. Quando perguntado sobre as condições do mar da Bahia, é assertivo. "O pior é o descaso com a segurança na navegação. A bandidagem percebendo que é fácil roubar um barco porque não há a menor fiscalização para coibir isso. É preciso haver um policiamento rígido neste sentido. Estamos entregues à própria sorte. O melhor são as nossas condições naturais, temperatura da água, o clima, os ventos, os inúmeros destinos... A pessoa morar na Bahia e não usar esse mar de forma plena, ela com certeza está perdendo uma parte maravilhosa da vida dela.



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